sexta-feira, 28 de novembro de 2008

A viagem do elefante - José Saramago



O lançamento mundial da mais recente obra de José Saramago teve como lugar de hospitalidade o Sesc Pinheiros -SP no dia 27/11/08. Com a presença de ilustres intelectuais como José Mindlin e os mais privilegiados espectadores dessa sessão memorável. A "conversa" sobre o livro que o excelentíssimo nobel promoveu foi uma agradável celebração simples.


Bem simples e bem serena, aliás sereno foi como ele mesmo definiu seu estado. A sensação foi de um encontro leve considerando todo peso que um escritor do porte dele tem para nos oferecer. Com seus 86 anos, debilitado pela saúde frágil, em recuperação constante da doença respiratória que o acometeu durante a produção da obra que começou em 1997, Saramago falou de suas impressões, de sua serenidade e do carater jovial do livro. " O livro conduz seu próprio caminho, ele se faz no fazer e esse se quis alegre, portanto, é um livro alegre".


Mesmo tendo sido interrompido com apenas 40 páginas escritas em maio de 97 na retomada as outras 40 páginas seguintes mantiveram intacto o espaço-temporal e inalterável o fio da narrativa e sua própria fatura. Saramago afirmou várias vezes que a doença apesar de muito séria e muito grave não aparece em uma linha sequer do romance ou conto ou autobiografia como chamou o presidente da Companhia das Letras (me escapa o nome) ou como quer que o chamem.


Contou sobre a história do elefante ter saido de uma visita a um restaurante donde havia um elefante grande de madeira trabalhada na entrada e na decoração acima dos clientes havia então um elefante que saia de Lisboa e percorria um espaço até chegar em Viena, na Áustria. Entusiasmado com a peculiaridade perguntou pela história e lhe passaram uma bibliografia, na qual descobrira a tal viagem de seu elefante chamado Salimão , oferecido como presente pelo rei D. João III de Lisboa no séc. XVI ao arquiduque austríaco Maximiliano II.


Contou também que na época não tinha "condições" de escrever nada sobre àquela história por não conhecer seu percurso e seus desdobramentos, mas que a guardou e tempos depois apareceu-lhe o momento de narrá-la, ficcionalizá-la e recriá-la para o mundo.




À Pilar que não me deixou morrer




A sua esposa Pilar Del Rio, como sempre cavalheiríssimo e encantado, rendeu as maiores e mais cordiais admirações e gratidão pelo cuidado com sua obra, atenção com sua saúde, pelo companheirismo estimadíssimo e incondicional e acima de tudo pelo amor maior e transcendental que se destinam ambos.


Dedicou o livro a ela e somente a ela pelo cuidado extremo que teve com ele na dificuldade e gravidade enfrentada durante a doença. E ela não menos admiradora e amorosa com seu marido foi a tradutora de seu livro para el castellano, pela Alfaguara na Espanha, país de sua origem. Lendo um trecho de sua carta publicada sobre a tradução no livro numa edição comemorativa de 1000 exemplares que saiu em Portugal, disse que um tradutor muito melhor que um crítico é o mais "honesto" leitor de uma obra, pois não olhará com olhos armados para a forma ou conteúdo ou estilo da mesma, mas é aquele que segue palavra por palavra a trilha percorrida pelo escritor e tenta minuciosamente captar para outra lingua a essencia de sua escrita. Acrescento é o tradutor talvez o mais autentico interpretador da história em outra leitura, já levada para outro lugar.


Saramago ainda disse que respondeu uma pergunta a um jornalista português, certa vez, que indagava o que queria ainda da vida um escritor com tanta fama, glória, um nobel e reconhecimento mundial. "Queria tempo, vida"- respondeu Saramago . Tempo e vida para continuar seu trabalho, para frutificar outras histórias e para, obviamente, viver com sua esposa, com sua querida e estimada Pilar.


Retomou essa indagação do jornalista e à sua resposta por dois momentos para reafirmar a escassez do tempo e também para responder ao diretor do sesc Danilo Miranda sobre como o Saramago se vê?


Bem, " eu me vejo um velho quando olho no espelho e isso é bom se olhar velho porque se tive a oportunidade de chegar até essa idade é porque nada me aconteceu antes que interrompesse esse momento". Sente-se confiante de ter feito um bom trabalho e comenta não estar com nada em mãos para outra produção, está em descanso como a terra quando preparada para o novo cultivo " em posio".




Fala ainda sobre a declaração e impressão de Pilar sobre seu livro " Um livro de sabedorias". Saramago concorda com as sabedorias ali presente, mas não como referência à ciência ou mesmo ao acumulo de conhecimento, mas à serenidade e equilibrio que encontrou na sua bem escrita obra, como afirma. " Não digo que é o melhor nem o pior livro como sempre acontece com os críticos tomarem parte de algum lado dessa dicotomia, mas digo, certamente não é o pior. É um bom livro, um livro bem escrito"




Para finalizar como um bom escritor que segue a cadência de sua escrita e o caminho de seu trabalho sem se preocupar com enquadramentos, conceituações ou categorizações de sua produção, criticou a classificação de obras chamadas de prosa-poética, pois para ele não existe isso. Pode existir sim poesia no desenvolvimento da narrativa, mas os dois formatos juntos é impossível.


Terminou se refirindo de novo aos seus 86 anos e a vontade de talvez voltar ao Sesc para lançar outro livro, por que não? Não diz que esse será seu último, por isso gostaria de mais tempo e vida para que pudesse continuar esse trabalho, mas nada mais pode dizer.

Num tom já nostálgico de vida e ânsia por mais vida para continuar, Saramago visivelmente debilitado pela saúde frágil deixou-nos a impressão receosa de que a cautela por sua saúde, pelo seu trabalho, pelas suas obras é algo que deve ser tão cuidadosamente preservado como sua estabilidade no meio literário internacional.


Fica-me a imagem dele como uma porcelana rara vinda de algum lugar da Índia, transpostada em confortáveis almofadas, carregada numa toada leve e confortável de um lombo forte e lento de um elefante manso e hábil. Esse é o "meu" Saramago nobre, vivo e leve como uma pegada de um elefante que percorreu e percorrerá muitos caminhos.



Salve qui pu, la vie


sexta-feira, 14 de novembro de 2008

MARCELO ARIEL NA Usp


No dia 06 de novembro de 2008. No prédio de Letras da Universidade de São Paulo tivemos o privilégio e a surpresa de conversar e nos aproximarmos de um poeta extraordinário. Marcelo Ariel, nascido em Santos(SP). Vive em Cubatão, donde coordena a editora Letra Selvagem.
Nossa conversa com ele foi edificante. Através da publicação de Tratado dos Anjos Afogados, 2008 , nos deleitamos com suas experiências ao longo dos 20 anos de escrita poética e também tomamos contato com seu pensamento, suas ”doutrinas”, “filosofias” ou simplesmente fantasmas de vida, vivências. Não há nem como definir. Seria um sacrilégio.
E é justamente nessa assimetria do outro que a poesia de Ariel está lançada, direcionando a relação como um encontro com a diferença que o outro me expõe, me apresenta. Para o poeta o é no encontro com o outro que se instaura o sagrado. O poema é a tentativa de contato com o outro. Ele se dá pela sensibilidade e autenticidade do humano.
Autenticidade que o poeta encontra na infância, quando o humano se abria ao outro com sua verdadeira alteridade, enunciava um eu íntegro, ao que hoje, na semi-presença de vivência somos fantasmas que encenam a vida cotidiana. Tudo é encenação.
Ao que ficou dessa conversa, foi o devir levado ao infinito de conhecer e ler mais e mais Marcelo Ariel, há muito para alterar-se com sua obra, há muita interação humana nessa caminhada. É um prazer sagrado tomar contato com suas poesias. A todo momento diversas possibilidades atravessam a emoção do meu ser, é a alteridade da não-presença, mas da relação com a essência , com o afeto que se instaura tanto no seu engajamento poético quanto na sua performance presente.
Para celebrarnos...

O EVANGELHO – Marcelo Ariel
Seja absolutamente diferente de mim e do que penso que você deveria ser, para que eu possa me abrir para o outro que você é, não como um animal fantasmagórico no espelho dos distanciamentos. Não como um outro eu clonado para as afinidades do ajuntamento irônico, mas para a significativa visão paradoxal do início de uma emancipação, longe dos domínios da coisificação-blindagem do eu. Me abrir para o encontro de uma autêntica filia onde predominem a espontaneidade, a leveza e a lentidão para essa alteridade. O amor como um valor laico e afeto como uma instância do atemporal, como um poema do irreconhecido fundado no desejo do impossível.

terça-feira, 11 de novembro de 2008

Ah, essas questões éticas...

Por especulação, não do capital, mas do “verbum interius” existe uma blindagem no ar que de tão intransitiva para algumas categorias, nos faz pensar, sentir, ou apenas aupiciar que não é possível uma ordenação libertária. Que talvez, só talvez não seja corajoso de nosso parte mudar a lógica sensata, àquela que faz sentido.
A questão é se perguntar : o que raios faz sentido para cada ser? Ou nem isso, menos ainda, tem alguma coisa a ser ilogicizada aqui? Não nesse mundo, ele apenas está em crise financeira, as guerras e genocídios continuam acontecendo, pessoas são presas, greves são tentativas de reclamação, perdeu o foco? Virou explicitação em praça pública, donde só a mídia se permite leitura. MENTIRA.
Alguém por aqui ou por aí perdeu o fio. E o fio que ainda dá pra se ver é aquele que segue o curso natural da vida. Ah? Que curso, àquele de Godot “Quando nada acontece, algo segue seu curso”?
No meu mundo pode-se questionar o vazio do quadrante da bienal, mas não pode questionar o Jornal quando acusa os “intervencionistas” de “depredadores”. Pode além, pode refletir e achar pulsante cada atitude, de todos os lados, dessa pluralidade o risco ganha efeito e a “questionaidade” se permite, ao menos, menos silêncio, menos atividade inerte e passiva.
Há que tomar cuidado com o que queremos pacificar. O discurso da paz cabe direitinho dentro da arte, cabe na sociedade disciplinadora quando aterrorizada com a vida privada lavada em domínio que deveria ser de discussão pública. A multidão emendou a ponta das cordas e agora a fronteira é líquida, portanto, o seu lado também é do vizinho e o que é de dentro do meu problema passa a virar fofoca de esquina em rede nacional.


O problema do pertencimento não seria prioridade se aquilo que agencio pertencesse ao que configuro como pertencido a mim, como se eu pudesse pegar uma obra desde seu contexto histórico e saber empiricamente criticar, contudo o que se vê é um emaranhado de avassaladoras e devastadoras conclusões sobre o que se está, daqui pra frente eu arrisco, pois a abertura do mundo me permite tomar todos os lugares, me apossar de todos os discursos e conhecer o tudo de toda obra sem discernimento temporal entre Tolken e Dostoievski.
A lógica é consumir, como sempre fora, mas agora com a diluição dos financiamentos, o que pertence a meu mundo diz que sou e sou aquilo que vigio de longe, com olhar de cobiça para estar lá? Não para estar cá, comigo, para que eu possa possuir, ter, obter, tocar, segurar...Consumir.


Segundo Lazzarato[1] , consumir não se limita a comprar e destruir um produto ou serviço, mas antes se refere ao pertencimento, à adesão a um mundo. E de que mundo se trata? Diz-nos o autor

"Basta ligar a televisão ou o rádio, passear numa cidade, comprar uma revista ou um jornal para saber que esse mundo é constituído por agenciamentos de enunciação, por regimes de signos cuja expressão se chama publicidade e cujo expresso constitui uma solicitação, uma ordem, que são, em si mesmos, uma avaliação, um julgamento, uma crença a respeito do mundo, de si mesmo e dos outros. O expresso não é uma avaliação psicológica, mas uma incitação, uma solicitação a esposar uma forma de vida

. Marx desenvolveu uma concepção materialista da História, afirmando que o modo pelo qual a produção material de uma sociedade é realizada constitui o fator determinante da organização política e das representações intelectuais de uma época

"A dimensão material do acontecimento, sua efetuação, se faz quando as maneiras de viver, de comer, de ter um corpo, de se vestir, de habitar etc., se encarnam em corpos: vive-se materialmente entre mercadorias e serviços que compramos, nas casas, entre os móveis, com os objetos e os serviços que captamos, como 'possíveis' no fluxo de informações e de comunicação no qual estamos imersos


[1] LAZZARATO, M. Créer des mondes. Capitalisme contemporain et guerres esthétiques. In: Multitudes, 15, Art Contemporain. La recherche du dehor. Paris: Hiver, 2004. Disponível em: http://multitudes.samizdat.net/article.php3?id_article=1285.

segunda-feira, 20 de outubro de 2008


Horácio Costa (São Paulo-SP, 14/12/54). Formado em Arquitetura e Urbanismo (FAUUSP, 1978); Mestre em Letras (New York University, 1983), PhD em Yale (1994). Professor na UNAM (México), 1987-2001. Desde então, é professor da FFLCH-USP.
Traduziu e publicou Octavio Paz (Piedra de Sol/Pedra de Sol, Rio, 88), Elizabeth Bishop (Antologia Poética, São Paulo, 90), César Vallejo (Poemas Humanos; México, Rio e Lisboa, 92), Xavier Villaurrutia (Nocturnos; Lisboa, 94); por publicarem-se Xavier Villaurrutia (Poesia Completa, São Paulo) e Blanca Varela (Canto Vilão, São Paulo).
Organizou dois eventos internacionais de poesia: "A palavra poética na América Latina, avaliação de uma geração" (São Paulo, Memorial da América Latina, 90; publicada em livro) e "O veículo da poesia" (São Paulo, Biblioteca Mário de Andrade, 98).
Outros livros: José Saramago: o período formativo (Lisboa, 97 e México, 03) e Mar abierto: ensayos sobre literatura brasileña, portuguesa e hispanoamericana (México, 01). Tem poemas ou livros traduzidos ao espanhol, inglês, francês, romeno, macedônio e búlgaro.
Foi presidente da ABEH — Associação Brasileira de Estudos da Homocultura.

domingo, 19 de outubro de 2008

Mafalda, a menina de 44 anos que ainda é símbolo mundial de contestação

Marisa Carvalhoda redação
Outros textos deste(a) autor(a)

A Mafalda, de Quino•

Há 44 anos, uma menina que detesta sopa e enche os adultos com perguntas embaraçosas cativa leitores e ilustra materiais da esquerda pelo mundo. Símbolo da rebeldia latino-americana, Mafalda segue atual com suas bandeiras feministas, sua preocupação com o destino da humanidade e sua ironia infantil, porém nada inofensiva.

Mafalda é uma menina argentina de cerca de sete anos, filha de pais de classe média, um empregado de uma companhia de seguros e uma dona-de-casa. Está sempre escutando rádio ou vendo TV em busca de notícias favoráveis à paz no mundo, tomado pela guerra do Vietnã, e ao progresso de seu país, vitimado pela inflação e pela migração de seus jovens por falta de oportunidade.


Politizada e indignada com a forma como os adultos prejudicam o mundo, Mafalda tornou-se símbolo de contestação na América Latina e na Europa.O criador de Mafalda é o argentino Joaquín Lavado Tejón, o Quino, que começou a publicar desenhos em 1954 na revista Esto Es.


Mafalda surgiu quando Quino precisou fazer um trabalho publicitário para uma indústria de eletrodomésticos chamada Mansfield. Ele deveria inventar uma história em que aparecessem produtos da marca, sem dizer seu nome, mas com insinuações nos nomes dos personagens, que deveriam começar com M. A denominação Mafalda veio de um filme argentino chamado Dar La cara, que tinha uma personagem com esse nome.


Os desenhos ficaram arquivados porque os jornais logo perceberam que se tratava de propaganda de uma marca. Somente em 1964 um amigo jornalista de Quino pediu os desenhos para a revista Primera Plana. Seis meses depois, a história fez tanto sucesso que precisou passar de semanal a diária.Mafalda reflete a ironia e o ceticismo de seu criador. Perguntado depois do fim da publicação das tiras como via o mundo atual, Quino foi duro: “Mal, muito mal. Alegro-me de não ser jovem”. Talvez por isso Mafalda e seus amigos sejam tão pouco crianças no sentido ingênuo de ver a vida.
Exemplo disso é uma frase cortante da personagem: “O que você gostaria de ser se vivesse?”.


Os especialistas no mundo de Mafalda dizem que o personagem Felipe é a encarnação de Quino, o que o próprio já reconheceu. Felipe é tímido e faz o possível para não incomodar ninguém, assim como seu autor, um menino de Mendoza, interior da Argentina, filho de pais espanhóis.


Já Manolito representa a ganância capitalista. Filho de um comerciante espanhol que migrou para a Argentina, o menino só pensa em dinheiro e em como fazer crescer o negócio do pai. Pouco vive a infância, uma crítica de Quino ao conservadorismo e à falta de imaginação provocada pela busca incessante do lucro.


A maturidade das crianças de Quino contrasta com a mediocridade dos pais de Mafalda. Enquanto a mãe abandonou uma carreira para se dedicar ao lar, o pai é um escravo da contabilidade de uma grande empresa, que se aliena da realidade na obsessão pelas plantas.O socialismo está presente em várias tiras.


Num mundo que ainda convivia com o chamado socialismo real da URSS, de Cuba e do Leste Europeu, é natural que o tema ocupasse e confundisse a cabecinha de Mafalda. Quando Felipe explica a ela que os peões vêm antes do rei e da rainha no xadrez, Mafalda custa a acreditar e acusa o pai do amigo, que o ensinou as regras, de socialista.O clima subversivo da época contaminou a Argentina.

A impressão de Mafalda é a de que os argentinos só gritavam para dizer “greve!”. Em várias situações a menina associa o socialismo ao totalitarismo e à falsa igualdade, reflexo do stalinismo que desvirtuou os princípios da Revolução Russa.Mafalda também é um símbolo do feminismo infantil, mostrando que as meninas desde cedo podem aprender a se valorizar e buscar sua independência.

Essa batalha pela autonomia feminina se evidencia nas discussões com Susanita, que só pensa em ser mãe de um médico, casar-se e ser dona-de-casa. Num dos diálogos, Mafalda diz que não há problema em ter filhos, “mas os tempos mudam. Além de ser mãe, hoje a mulher deve contribuir com o progresso, fazer coisas importantes”. Susanita entende que uma das coisas que uma senhora importante pode fazer é jogar bridge enquanto espera o marido chegar.


Durante os nove anos em que suas tiras foram publicadas, o mundo viveu intensos conflitos que certamente influenciaram a criação de Quino. Em suas tiras, Mafalda se interessa mais pela guerra no Vietnã e pela ameaça atômica do que pelo mundo de menina de Susanita.
No dia 15 de março de 1962, quando Malfada nasceu, o governo da Guatemala anunciava que 12 guerrilheiros haviam morrido em batalhas contra o exército. Quando foi publicada a primeira tira de Mafalda, em 29 de setembro de 1964, o Equador vivia protestos e renúncias de ministros pela alta dos impostos.

No mundo, os EUA revelavam que a China poderia exibir uma prova nuclear a qualquer momento.Quando Manolito aparece pela primeira vez numa tira, em 29 de março de 1965, a embaixada dos EUA em Saigon, no Vietnã do Sul, sofreu um atentado, ao qual o governo americano reagiu bombardeando uma ilha sul-vietnamita.

Quando Malfada se despede de seus leitores, em 25 de junho de 1973, o Senado dos EUA enfrentava o presidente Richard Nixon pelo bombardeio no Camboja.

Assista ao filme O mundo de Mafalda

terça-feira, 14 de outubro de 2008

ALÔ, LIBERDADE


Chico Buarque
Composição: Enriquez/Bardotti/Chico Buarque

Alô, liberdadeDesculpa eu vir
Assim sem já era tarde
E os galos tão
Cansados de cantar
Bom dia, alegria
A minha companhia
Vai cantar
Sutil melodia
Pra te acordar
Quem vai querer tocar trombeta
Pem pererém pererémPempem
Quem vai querer tocar matraca
Tracatracatraca
Tracatraca

Quem vai de flauta e clarineta
Fi fiririFiriri fifi
Quem é que vai de prato e facaa
Taca cheque taca
Chequetaca checá

Quem vai querer sair da banda
Pan pararan
Pararan panpan
Hoje a banda sairá
Alô, liberdadelevante, lava o rosto
Fica em péComo é, liberdade ...

Vou ter que requentar
O teu caféBom dia, alegria
A minha companhiaVai cantar
Em doce harmonia
Pra te alegrar
Quem vem com a boca no trombone
Pom pororom
pororom pompom

Quem vem com a bossa no pandeiro
Chá caracháCarachá chachá
E quem toca só toca telefone
Trim tiririmTiririm trimtrim

E quem só canta no chuveiro
Trá tralaláTralalá lalá
Quem vai querer sair na banda
Pan panpan
Hoje a banda sairá
Laiaralaialaialaiá
Hoje a banda sairá
Olá, liberdade!

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

MARCELO ARIEL

Queimar a Nuvem

Cara Ana C.

Inútil o tempo gasto em reduzir o vivido (O essencial do, inclusive)a uma ética para fantasmas que se renovam através da estratificação de falsos êxtases projetados no fracasso de um pacto que de modo algum exclui o fracasso da lucidez, se qualquer instante se revelava uma gestão onírica de tensões e silêncios insuportáveis sem nenhuma isenção bíblica e que se materializavam sempre como afastamento e opacidade ou suspenção e adiamentodo que poderia SIM ter sido a raiz quadrada do maravilhoso apesar do EU que não esteve em mundo algum ( VER o trunfo de Celan e Eliot Smith)...Que foi um mínimo sair de si como o pesadelo da cobra mordendo o próprio rabo para tornar igual o dentro e o fora e fazer do invisível mais do sua outra parte: o vôo-futuro fogo para a nuvem de enganos de quem fica te deu ao menos a volúpia ou o torpor da invisibilidade e do inexistido.


Marcelo Ariel é escritor, publicou no ano passado o livro “ME ENTERREM coM MinhA Ar 15 (Scherzo-Rajada)” pela Dulcinéia Catadora e é proprietário do sebo itinerante “O Invisível”, em Cubatão, onde vive.
Mantém os blogues Teatrofantasma, http://www.avidaeoteatrofantasma.blogspot.com/ e http://www.ouopensamentocontinuo.blogspot.com/, além de uma coluna na revista eletrônica Critério.
Para a aquisição de um exemplar de seu livro, basta enviar o pedido por e-mail para dulcineiacatadora@gmail.com. Também à venda na livraria Realejo (Gonzaga-Santos) na mercearia São Pedro e no Sebo do Bactéria (em São Paulo).

quarta-feira, 8 de outubro de 2008

Do fundo do meu coração

Adriana Calcanhotto
Composição: Roberto Carlos/ Erasmo Carlos


Eu, cada vez que vi você chegar
Me fazer sorrir e me deixar
Decidido eu disse: nunca mais
Mas novamente estúpido provei

Desse doce amargo, quando eu sei
Cada volta sua o que me faz
Vi todo o meu orgulho em sua mão
Deslizar, se espatifar no chão
Eu vi o meu amor tratado assim

Mas basta agora o que você me fez
Acabe com essa droga de uma vez
Não volte nunca mais pra mim

Eu, toda vez que vi você voltar
Eu pensei que fosse pra ficar
E mais uma vez falei que sim
Mas já depois de tanta solidão
Do fundo do meu coração

Não volte nunca mais pra mim
Se você me perguntar se ainda é seu
Todo meu amor, eu sei que eu
Certamente vou dizer que sim
Mas já depois de tanta solidão
Do fundo do meu coração
Não volte nunca mais pra mim

domingo, 28 de setembro de 2008

Me arrependo

Sempre me arrependo
A todo momento, dos quais vivemos, estou sempre me arrependendo
Arrependo do arrepio, da falta dele
arrepio de frio, arrependo do calor, arrepio arrependido
Arre, que me arrependo de tanto arrepender.
Aos instantes daquelas máculas não resolvidas, daquelas memórias tão vivas
as menções doídas, as reflexões futuras tão permitidas.
A abertura para o imprevisto e o inexato tão enorme, imensidão, infinitude para se arrepender, vastidão receosa que só de pensar arrepia, já me arrependo.
Ponto estático, inércia ao primeiro passo e o seguinta, imobilidade tão profícua que me leva a movimentar, ando mais me arrependendo que aprendendo como não se arrepiar, ando mais quando me arrependo, penso que esse ponto parado me levará a mais arrepensamentos.
Desse lugar pulo, salto e jogo alhures, outros arrepiomentos.
Socorro
Arnaldo Antunes

Socorro!Não estou sentindo nada
Nem medo, nem calor, nem fogo
Não vai dar mais pra chorar
Nem pra rir...

Socorro!

Alguma alma
Mesmo que penada
Me empreste suas penas
Já não sinto amor, nem dor
Já não sinto nada...

Socorro!
Alguém me dê um coração
Que esse já não bate
Nem apanhaPor favor!
Uma emoção pequena
Qualquer coisa!
Qualquer coisa
Que se sinta...

Tem tantos sentimentos
Deve ter algum que

Alguma rua que me dê sentido
Em qualquer cruzamento
Acostamento, encruzilhada

Socorro!
Eu já não sinto nada...
Socorro!Não estou sentindo nadaN
em medo, nem calor, nem fogo
Nem vontade de chorar
Nem de rir...

Socorro!Alguma alma
Mesmo que penada
Me empreste suas penas
Já não sinto amor, nem dor
Já não sinto nada...

Socorro!
Alguém me dê um coração
Que esse já não bate
Nem apanhaPor favor!
Uma emoção pequena
Qualquer coisa!
Qualquer coisa
Que se sinta...

Tem tantos sentimentos
Deve ter algum que sirva
Qualquer coisa
Que se sinta
Tem tantos sentimentos
Deve ter algum que sirva...


Ah, esse desespero, essa lassidão, essa sensação insossa.
Nada vejo, nesse beco que me vejo, não tenho portas, não tenho beijo.
Apenas eu, me espalho. Meu espelho
Essa alteridade inalienável.
Sem escape fujo para dentro de mim, do meu deus ausente,
dessa centelha fina que não balança nem regula a lógica,
porém estipula a memória e dirige se há, há, à,
a uma glória.
O há, o instante "há", onde este está?
Portal oculto da mágica de Harry Potter é possível, diz cientista

Cálculos revelam que camuflagem de luz pode ocultar passagem em parede
IGOR ZOLNERKEVIC
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Físicos chineses descobriram como usar materiais especiais que manipulam a luz para criar uma passagem secreta invisível em uma parede.Um dos autores da descoberta, Xudong Luo, da Universidade de Jiao Tong, em Xangai, confessou à Folha que é fã da série de livros "Harry Potter" e que não teve dúvida de concluir no artigo científico em que descreve seus cálculos que "um dispositivo como a Plataforma 9 3/4 (...) é realizável".

Luo e seus colaboradores calcularam o que é preciso para realizar a mágica de ocultar uma abertura em uma parede.O truque é usar materiais especiais, capazes de manipular a luz que incide sobre eles. Chamados de "metamateriais", eles podem entortar raios de luz em direções impossíveis para materiais comuns, graças a rugosidades microscópicas em suas superfícies.
A mágica ocorre quando se põe no meio da abertura da parede uma coluna revestida de metamaterial. A luz se espalha em volta da coluna, formando uma espécie de "camuflagem" que bloqueia toda a abertura.Os físicos calcularam ainda o que ocorre quando alguém atravessa a camuflagem de luz. Ela ondularia um pouco e o lado oculto da parede ficaria parcialmente visível por instantes.
O efeito parece sobrenatural, mas na verdade é apenas uma versão exagerada do que ocorre quando a luz passa por um copo de vidro cheio de leite."Quando você olha para um copo de leite, você não vê o vidro", disse o físico britânico John Pendry, do Imperial College, em Londres, em uma reportagem da revista "Nature".
O leite espalha a luz de maneira que parece se estender até a superfície externa do copo. O que os físicos chineses fizeram foi criar um material que espalha a luz muito mais do que o leite. É como se o leite em um recipiente de vidro se projetasse para fora dele.Falta agora tentar levar o projeto da teoria para a prática.

sexta-feira, 21 de março de 2008

Noturno

Quem tem coragem de perguntar, na noite imensa?
E que valem as árvores, as casas, a chuva, o pequeno transeunte?
Que vale o pensamento humano,esforçado e vencido,na turbulência das horas?
Que valem a conversa apenas murmurada, a erma ternura, os delicados adeuses?
Que valem as pálpebras da tímida esperança,orvalhadas de trêmulo sal?

O sangue e a lágrima são pequenos cristais sutis,no profundo diagrama.
E o homem tão inutilmente pensante e pensado só tem a tristeza para distingui-lo.
Porque havia nas úmidas paragens animais adormecidos, com o mesmo mistério humano:
grandes como pórticos, suaves como veludo,mas sem lembranças históricas, sem compromissos de viver.

Grandes animais sem passado, sem antecedentes,puros e límpidos,apenas com o peso do trabalho em seus poderosos flancos e noções de água e de primavera nas tranqüilas narinas e na seda longa das crinas desfraldadas.

Mas a noite desmanchava-se no oriente,cheia de flores amarelas e vermelhas.
E os cavalos erguiam, entre mil sonhos vacilantes,erguiam no ar a vigorosa cabeça,e começavam a puxar as imensas rodas do dia.

Ah! o despertar dos animais no vasto campo!
Este sair do sono, este continuar da vida!
O caminho que vai das pastagens etéreas da noite ao claro dia da humana vassalagem!

(Cecília Meireles)